Crônica – Quarentena https://quarentena.org Curta sua casa: Indicamos produtos e serviços pagos e gratuitos pra que você aproveite melhor sua casa. :) Fri, 04 Sep 2020 18:34:14 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.6.1 https://quarentena.org/wp-content/uploads/2020/04/cropped-logo2_quarentena_512x512px-1-32x32.png Crônica – Quarentena https://quarentena.org 32 32 “Os dias lindos”, Carlos Drummond de Andrade, Companhia das Letras https://quarentena.org/indicacoes/os-dias-lindos-drummond-cia-letras/ https://quarentena.org/indicacoes/os-dias-lindos-drummond-cia-letras/#respond Tue, 14 Apr 2020 11:12:15 +0000 https://quarentena.org/?post_type=product&p=5294 Carlos Drummond de Andrade, um dos nossos maiores escritores em textos sobre as belezas (e as eventuais agruras) da vida cotidiana.]]>

Apresentação de Os dias lindos, de Carlos Drummond de Andrade

Reunindo textos publicados originalmente no Jornal do Brasil, no qual o escritor mineiro mantinha uma cadeira cativa na página de crônica, Os dias lindos traz não apenas o texto leve e circunstancial que ajudou a inscrever o nome de Carlos Drummond de Andrade na história desse gênero tão brasileiro, mas também uma miríade de pequenos contos e narrativas. Todos bastante diversos entre si, mas com um denominador comum: a enorme facilidade que o autor demonstra para criar enredos e personagens cheios de graça.

Dividido em seis grandes seções, este livro surpreende o leitor com sua mistura de observação da vida cotidiana com a melhor fabulação do grande autor mineiro. A vida da classe média carioca, a nossa relação com a linguagem, o crescente processo de urbanização das cidades brasileiras – tudo isso comparece com ironia e alguma poesia.

Anota a crítica Beatriz Rezende, autora do esclarecedor posfácio a esta edição: “Finalmente, vale destacar que, dos vários conjuntos de crônicas publicados por CDA, Os dias lindos talvez seja o que frequentemente se detém sobre a própria linguagem, seus múltiplos usos, suas variações. É sobre linguagem da cidade que os textos falam, falando a linguagem da cidade. Linguajares esquecidos são recuperados, jogos de palavra, tempos dos verbos, flexões e concordâncias”.

Leia um trecho, clicando aqui.

 

Índice / Sumário de Os dias lindos, de Carlos Drummond de Andrade

Quatro histórias

Corrente da sorte

i. Quarenta e oito cópias em quarenta e oito horas
ii. Considerações intervalares
iii. A tarefa posta em questão
iv. Entreabre-se a porta para a aventura
v. A tranquila viagem
vi. O homem testado
vii. Diálogo na fazenda
viii. Foste tu que o disseste, João
ix. O nome e o número
x. Cavalgada
xi. Final panorâmico

História de amor em cartas
A visita inesperada
Jacaré de papo azul

Seis historinhas

Pescadores
Depois do jantar
A viúva do viúvo
Tatu
Noiva de Pojuca
No caminho de Canela de Boi

O homem e a linguagem

O homem, animal exclamativo
O homem, animal que pergunta
O homem no condicional
O homem e suas negativas
Dizer e suas consequências
As palavras que ninguém diz

Conversa na fila

Prazer em conhecê-lo
Olá, mestre
Caso de sequestro
O clube da ilusão em Felisburgo
A flor e seu nome
Zarandalha
Despedida de cordel
passagem do ano
Vacina de ano-novo
Anúncio de viver
Canção de todos os carnavais
Equipamento escolar
Os dias lindos
Presente para a senhora
Outro presente para a senhora
Dia santo e feriado
Tanajura como alimento
Cosme e Damião: o senso da fraternidade
Elegia do Guandu
O crime de Fátima

Ah, como a vida é burocrática!

Eu, você, ele: números
A dependente
O novo Diário Oficial
O sabor da laranja
Poluição sob controle
Como prevenir assaltos
Sem ódio
Autoridade e cartão
Venha correndo
Hora de chorar
Apólice
Tempo perdido
Morrer é fácil; difícil é ser enterrado

Matutações

O estranho caso de 2 e 2
A segunda primeira vez
Que fazer com os pelos do ouvido
Desagradável
A mão e o convite
Como se fosse balanço
Estátuas egípcias
Projeto de carta
Nota da edição

Posfácio

“A prosa nos jornais”. por Beatriz Resende.

Leituras recomendadas

Cronologia

Vida e obra de Drummond através de entrevistas


Programa produzido pela TV Cultura.

 

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“70 Historinhas”, de Carlos Drummond de Andrade

Caminhos de João Brandão”, de Carlos Drummond de Andrade

Sentimento do mundo“, de Carlos Drummond de Andrade

Fala, Amendoeira“, de Carlos Drummond de Andrade

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“Caminhos de João Brandão”, de Carlos Drummond de Andrade https://quarentena.org/indicacoes/caminhos-de-joao-brandao-de-carlos-drummond-de-andrade/ https://quarentena.org/indicacoes/caminhos-de-joao-brandao-de-carlos-drummond-de-andrade/#respond Tue, 14 Apr 2020 05:21:45 +0000 https://quarentena.org/?post_type=product&p=5226 Carlos Drummond de Andrade, um dos nossos maiores escritores em textos sobre as belezas (e as eventuais agruras) da vida cotidiana.]]>

Apresentação

João Brandão é figura singular na crônica brasileira. Não é pseudônimo, como o Manassés e o João das Regras que em momentos diferentes ocultaram Machado de Assis de seus contemporâneos. Tampouco é personagem de contornos detalhados e vida própria como Tia Zulmira ou Primo Altamirando, criaturas de Stanislaw Ponte Preta – este sim pseudônimo, que acabou sobrepondo-se a seu criador, Sérgio Porto. João Brandão poderia ser definido, pelo menos a princípio, como um alter ego de Carlos Drummond de Andrade, gauche como convém ao poeta e de participação um tanto episódica em sua longa carreira de cronista. Mas a melhor medida de sua importância talvez seja mesmo este livro, que saiu pela primeira vez em 1970 reunindo publicações da década anterior. ”

É com essas palavras que o escritor e jornalista Paulo Roberto Pires, autor do esclarecedor posfácio desta edição, resume o papel da criação do cronista Carlos Drummond de Andrade. Embora figure numa pequena porção dos textos reunidos neste volume, o personagem drummondiano se impõe como uma consciência fluida – por vezes zombeteira, noutras melancólica – da vida e dos acontecimentos do Brasil das décadas de 1950 e 1960. E vai além: João Brandão funciona como uma espécie de repositório das opiniões de toda uma fração da sociedade (em especial, a carioca) a respeito dos grandes e pequenos temas de seu tempo. As mudanças nos costumes, a mesquinhez da vida política, a brutalidade diária – tudo isso é traduzido em prosa clara, acessível e de leitura imensamente prazerosa.

Porque Drummond é também um clássico da nossa crônica, tanto que seus textos não envelheceram um centímetro. A despeito de serem (como toda crônica, aliás) bastante relacionados ao tempo em que foram escritos, os artigos ainda possuem relevância graças ao estilo desassombrado do autor e a algo quase inefável, mas que é fruto de um rigoroso trabalho de estilo ao longo de décadas colaborando com jornais: a leveza e a inteligência sutil e penetrante que abarcam praticamente todos os aspectos da vida social, cultural e emocional de uma grande cidade brasileira.

Leia um trecho, clicando aqui.

 

Sumário

História do animal incômodo

O cavalo
Opiniões
A cauda
A situação complica-se
Final

Para um dicionário
Telefone
Diabos de Itabira
José de Nanuque
O chope e a passagem
Impróprio para mineiro
Conversa de casados
A mesária
O amigo que chega de longe
Bombas sobre a vida

A fugitiva

Nova canção (sem rei) de Tule
Tudo de novo
O Rio em pedacinhos
O outro nome do verde
Dias que eles inventam

Do papai
Diploma
A nova aurora
Namorados no mundo

FMI
Escolha
O PTT
Descanso de garçom
A eterna imprecisão de linguagem
Na fossa
Acertado
A cápsula
No festival
Um livro, um sorriso
Antigamente
A datilógrafa
O indesejado
Os olhos
O importuno
O novo homem
O jardim em frente
Nós, antiguidades
Perigos e sonhos

Este Natal
Para cada um

O nome
Inativos
Encontro
Exercício de/sem (?) estilo
União nacional em três dias
A lixeira
O dono
Entre a orquídea e o presépio
Memorial das águas

Dois no Corcovado
Voluntário
Na treva
O telhado

Na escada rolante
A festa acabou

O beijo nos lábios
Sebastião explica-se

Cabral, em sua estátua
Queixa de uns óculos errados
Escolha seu batente
Casamento
Requerimento conservador
Um chamado João
Guignard na parede
Surge o poeta da flor
Que dia é hoje, Leninha?
História do cidadão no poder

João Brandão salvará o país?
Nova bossa: a qualqueridade
Começou assim o novo governo
Pedras no caminho de jb
Final (sem drama) da crise

O morto de Mênfis

Nota da edição

Posfácio

“O alter ego de todo mundo”. por Paulo Roberto Pires.

Leituras recomendadas

Cronologia

Vida e obra de Drummond através de entrevistas


Programa produzido pela TV Cultura.

 

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“70 Historinhas”, de Carlos Drummond de Andrade

Sentimento do mundo“, de Carlos Drummond de Andrade

Os dias lindos“, de Carlos Drummond de Andrade

Fala, Amendoeira“, de Carlos Drummond de Andrade

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“70 Historinhas”, de Carlos Drummond de Andrade https://quarentena.org/indicacoes/70-historinhas-carlos-drummond-de-andrade/ https://quarentena.org/indicacoes/70-historinhas-carlos-drummond-de-andrade/#respond Tue, 14 Apr 2020 02:39:31 +0000 https://quarentena.org/?post_type=product&p=5222 Carlos Drummond de Andrade.]]>

Apresentação de 70 historinhas

Lançado em 1978, 70 historinhas reúne a prosa já publicada por Carlos Drummond de Andrade em outros livros. São crônicas e contos – ou “cronicontos” – em que a observação caminha junto com a fabulação, o humor roça cotovelos com o lirismo e a crítica aparece arejada pelo deboche.

Treze das histórias deste livro têm crianças e adolescentes como personagens, sem que o autor se preste a infantilizá-las, pela paródia da linguagem ou pelo primarismo das ações. Pelo contrário, elas enfrentam, contestam e vencem, muitas vezes, os detentores da autoridade, com a inteligência e a argúcia a que recorrem para desafiar-lhes o poder.

Mais um lance de gênio de um dos mais importantes autores brasileiros de todos os tempos..

A editora disponibiliza um trecho de 70 historinhas como degustação em pdf, mas você também pode lê-lo logo abaixo.

 

Índice / Sumário do livro 70 historinhas

O jardim em frente
Nascer
Pescadores
Assalto
Caso de secretária
A cabra e Francisco
Coração segundo
O telhado
Drink
Caso de arroz
A cápsula
Dois no Corcovado
Premonitório
Depois do jantar
Caso de escolha
A datilógrafa
Suspeita
Voluntário
Três homens na estrada
Caso de canário
A festa acabou
Na delegacia
Duas mulheres
À procura de um rosto
Caso de justiceiro
No caminho de Canela de Boi
Prazer em conhecê-lo
Serás Ministro
Peru
Caso de boa ação
Recalcitrante
Quadro na parede
Ladrões no terraço
De fraque
Caso de menino
Luzia
No ônibus
O dono
Noiva de Pojuca
Caso de recenseamento
O importuno
Banco barroco
Maneira de olhar
Essência, existência
Caso de chá
Glória
A menininha e o gerente
O crime de Fátima
Iniciativa
Caso de conversa
Juiz de paz
Esparadrapo
Acertado
O segredo do cofre
Caso de almoço
O outro Emílio Moura
Conversa de casados
Aconteceu alguma coisa
O sono
Caso de ceguinho
Guignard na parede
O pintinho
Boneca triste
No restaurante
O outro marido
A visita inesperada
O ladrão
Na escola
A viúva do viúvo
Jacaré de papo azul

Nota da edição

Posfácio

“Mais que historinhas”, por Edmílson Caminha.

Leituras recomendadas

Cronologia

 

Trecho da obra 70 historinhas

O jardim em frente

Os big-shots da empresa estavam reunidos em conferência. Assunto importante, desses que exigem atenção, objetividade. O
presidente recomendara:

— Não estamos para ninguém. Essa porta fica trancada. Avisem a telefonista que não atenda a nenhum chamado. Nem do papa.

Começou-se por dividir o assunto em partes, como quem divide um leitão. Cada parte era examinada pelo direito e pelo avesso, avaliada, esquadrinhada, radiografada. Cartesianamente.

— Você aí, quer fazer o favor de parar com essa caricatura?

O presidente não admitia alienação. Por sua vez, foi advertido pelo vice:

— E você, meu caro, podia deixar de bater com esse lápis, toc, toc, toc, na mesa?

Estavam tensos, à véspera de uma decisão que envolvia grandes interesses. Alguém bateu à porta.

— Não respeitam! Não respeitam o trabalho da gente! Isso não é país!

Seja ou não seja país, quando batem à porta a solução é abrir, para evitar novas batidas, ou, mesmo, que a porta venha abaixo. Pois ninguém deixa de bater, se sabe que tem gente do outro lado.

O diretor-secretário abriu, de óculos fuzilantes. O chefe da portaria, cheio de dedos, balbuciou:

— Essa senhora… essa senhora aí. Veio pedir uma coisa.

O primeiro impulso do diretor-secretário foi demitir imediatamente o chefe da portaria, servidor antigo, conceituadíssimo, mas viu ao mesmo tempo diante de si a imagem consternada do homem e a lei trabalhista: duas razões de clemência. Pensou ainda em mandar a senhora àquele lugar de Roberto Carlos ou a outro pior. Dominou-se: ela ostentava no rosto aquela marca de tristeza que amolece até diretoria.

— A senhora me desculpe, mas estou tão ocupado.

— Eu sei, eu é que peço desculpas. Estou perturbando, mas não tinha outro jeito. Moro do outro lado da rua, no edifício em frente. Meu canário…

— Fugiu e entrou aqui no escritório? Eu mando pegar. Fique tranquila.

— Antes tivesse fugido. Morreu.

— E daí?

— Viveu quinze anos conosco. Era uma graça… Pousava no dedo…

— E daí, minha senhora?

— O senhor vai estranhar meu pedido… Eu estava sem coragem de vir aqui. Por favor, não ria de mim.

— Não estou rindo. Pode falar.

— Os senhores têm um jardim tão lindo na cobertura. Da minha janela, fico apreciando. Então agora está uma coisa. Posso fazer um pedido?

— Pode.

— Eu queria enterrar o meu canário no seu jardim. Lá é que é lugar bom para ele descansar. O senhor vê, nós temos aquele terrenão ao lado do edifício, com três palmeiras, um pé de fruta-pão, mas é grande demais para um passarinho, falta intimidade. Se o senhor consente, eu mesma abro a covinha. Não dou o menor trabalho, não sujo nada.

O diretor-secretário esqueceu que tinha pressa, que havia um problema sério a discutir. Que problema? Naquele momento, o importante, o real era um canarinho morto, e amado.

— Pois não, minha senhora, disponha do jardim. Eu mesmo vou levar a senhora lá em cima, para escolher o lugar.
Subiram, escolheram o canteiro mais apropriado, onde bate sol pela manhã, e à tarde as plantas balançam levemente, à brisa do mar.

— Não é abuso eu fazer mais um pedido? Queria que o jardineiro não revolvesse a terra neste ponto, durante três meses. O tempo de os ossinhos dele se desfazerem… Volto daqui a meia hora, para o enterro.

Meia hora depois, voltava com uma caixinha forrada de veludo azul-claro, e a reunião dos big-shots, que ainda durava, foi suspensa para que todos, com o presidente muito compenetrado, assistissem ao sepultamento.

06/10/1967

Vida e obra de Drummond através de entrevistas


Programa produzido pela TV Cultura.

 

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Caminhos de João Brandão”, de Carlos Drummond de Andrade

Sentimento do mundo“, de Carlos Drummond de Andrade

Os dias lindos“, de Carlos Drummond de Andrade

Fala, Amendoeira“, de Carlos Drummond de Andrade

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“Fala, Amendoeira”, de Carlos Drummond de Andrade https://quarentena.org/indicacoes/fala-amendoeira-carlos-drummond-andrade/ https://quarentena.org/indicacoes/fala-amendoeira-carlos-drummond-andrade/#respond Tue, 14 Apr 2020 01:47:12 +0000 https://quarentena.org/?post_type=product&p=5213 Rio de Janeiro, do cinema, da política e dos afetos, Carlos Drummond de Andrade oferece – com delicadeza, inteligência cortante e uma prosa a um só tempo clássica e moderna – um retrato do Brasil de seu tempo. E que, como sabemos hoje, alcançaria a eternidade.]]>

Apresentação de Fala, Amendoeira

“Fala, amendoeira”, de Carlos Drummond de Andrade. Fala Amendoeira.
fala amendoeira drummond

Fala, amendoeira é uma reunião de crônicas originalmente publicadas no jornal Correio da Manhã, em que o poeta mantinha uma coluna desde 1954. Em texto introdutório, Carlos Drummond de Andrade escreve uma espécie de tratado do gênero: “Este ofício de rabiscar sobre as coisas do tempo exige que prestemos alguma atenção à natureza – essa natureza que não presta atenção em nós. Abrindo a janela matinal, o cronista reparou no firmamento, que seria de uma safira impecável se não houvesse a longa barra de névoa a toldar a linha entre o céu e o chão – névoa baixa e seca, hostil aos aviões. […]”.

Porque a crônica vive em grande parte desses contrastes, daquilo que poderia ter sido (antigamente, num tempo ameno, na infância do autor, numa era de ouro) e aquilo que de fato é (a vida em cidades que crescem e se transformam desordenadamente, o próprio envelhecimento do autor, as atordoantes mudanças de costumes a cada passagem de geração). Não foi à toa que, à época da publicação do volume, Rubem Braga saudou o Drummond cronista. Como o autor capixaba, o mineiro investia com o arsenal clássico: memória, comentários sobre a mudança do tempo e dos costumes, críticas municipais, um pouco de vida literária e outros textos de circunstância.

O Drummond de Fala, amendoeira é um dos grandes artífices da crônica. Injeta a medida certa de lirismo, é um observador astuto e mescla comentário com um pouco de ficção. Quanto à linguagem, estes textos são puro Drummond: calorosos e informais, suavemente cultivados e ligeiramente emburrado. Uma leitura sempre fluente e prazerosa.

A editora disponibiliza um trecho como degustação em pdf, mas você também pode lê-lo logo abaixo.

 

Índice / Sumário do livro Fala, Amendoeira

mentiras

Garbo: novidades
Um sonho modesto
Assembleia baiana
A eleição diferente

lugares

Nobre rua São José
Buganvílias
O murinho
A casa
Arpoador

costumes

Cor-de-rosa
Facultativo
Mistério da bola
O Grêmio Artur Azevedo
Liquidação
A mobília
Delícias de Manaus
14 dólares
Carta ao Ministro

problemas

Varrendo a testada
A fabulosa renda
Diário

datas

Feriados
Diante do carnaval
Visita
Aeroprosa
Os mortos
Musa natalina

letras

Academia GOnçalves
Diálogo feroz
O outro
Drink

bichos

Elegia de Baby
Anúncio de João Alves
Um sorriso
O pintinho
Iniciativa
Canto carioca
O cão viajante

meninos

Netinho
Gente
O sono
Divertimento
Meninos do Cabo
Pingo
O principezinho

despedidas

A musa de Visconti
Caro Ataulfo
À porta do céu
O antropófago
Nosso amigo Landucci
O feiticeiro

situações

Nascer
Suspeita
Essência, existência
Premonitório
Uma corda
O chamado
Os gregorianos
Luta
Morte na obra
Ventania
Peru

Posfácio

“As coisas do tempo: a crônica na obra de Carlos Drummond de Andrade”. por Ivan Marques.

 

Trecho da obra Fala, Amendoeira

Mentiras

garbo: novidades

Um semanário francês publicou a biografia de Greta Garbo, e embora não conte nada de novo sobre esse fenômeno cinematográfico desconhecido da geração mais moça, atraiu a atenção dos leitores.

A este humilde cronista, a publicação interessou sobretudo porque lhe abriu a urna das recordações; e ainda porque lhe permite desvendar um pequeno segredo velho de vinte e seis anos, e os senhores sabem como os segredos, à força de envelhecer, perdem a significação.

Passado um quarto de século, considero-me desobrigado do compromisso assumido naquela tarde de outono, no Parque Municipal de Belo Horizonte, e revelarei uma página — meia página, se tanto — da vida particular de Greta Garbo.

Está dito na biografia de Paris Match que, depois de recusar o papel de vamp em As mulheres adoram diamantes, oferecido por Louis B. Mayer, a extraordinária atriz se fechou em copas, por cinco meses, em seus aposentos do hotel Miramar, em Santa Mônica, até obter aumento de salário. É falso. Durante esse período, Greta viajou incógnita pela América do Sul, possuída de tedium vitae, e foi dar com sua angulosa e perturbadora figura na capital mineira, onde apenas três pessoas lhe conheceram a identidade.

Corria o ano de 1929, e como corria: a luta pela sucessão do presidente Washington Luís assumira desde logo aspecto violento, mas não deixávamos, eu e um grupo de amigos diletos, de frequentar o cineminha local, onde a Garbo, já em pleno fastígio da glória, desbancava todas as “estrelas” do mundo. Certa manhã, pálido e emocionado, o poeta Abgar Renault bateu-me à porta, reclamando cooperação. Uma senhora estrangeira chegaria pelo noturno da Central, às dez horas (isto é, às três da tarde, pois o trem vinha sempre atrasado). Fora-lhe recomendada por um professor sueco, então nos Estados Unidos, com quem Abgar se correspondia a respeito de poetas elisabetianos. Tínhamos de
reservar-lhe aposentos no Grande Hotel, do Arcângelo Maletta, e proporcionar-lhe distrações campestres, mas a senhora fazia questão de não travar relações com ninguém e se ele, Abgar, queria os meus serviços, era em razão de nossa fraterna amizade.

Tomamos providências e, à tardinha, vimos descer do carro-dormitório, dentro de um capotão cinza que lhe cobria o queixo, e por trás dos primeiros óculos pretos que uma filha de Eva usou naquelas paragens, um vulto feminino estranho e seco, pisando duro em sapatões de salto baixo. Mal franziu os lábios para cumprimentar o meu amigo, olhou-me como a um carregador, e disse-nos: “I want to be alone”. Depois, manifestou os dentes num largo sorriso, como a explicar: “Mas isso não atinge a vocês”. E de fato, nos dias que se seguiram, mostrou-se cordialíssima conosco, sempre através dos conhecimentos de inglês de Abgar, já então notáveis.

Não tardei, por iluminação poética, a identificar a misteriosa viajante, que dava grandes passeios pela serra do Curral acima, e um dia se dispôs a ir a pé a Sabará, empresa de que a dissuadimos, horrorizados. Revelei a Abgar minha descoberta e ele, arregalando os olhos, suplicou-me, por tudo quanto fosse sagrado para mim, que não contasse a ninguém. Fiz-lhe a vontade. Os outros amigos ignoraram tudo. Capanema, Emílio Moura, Milton Campos, João Pinheiro Filho etc., olhavam-nos surpresos ante aquela relação estranha. Explicamos que se tratava de uma naturalista em férias, miss Gustafsson. E a cidade não soube que hospedava pessoa daquela importância. É facílimo enganar uma cidade.

Apenas o Jorge, chofer árabe que nos servia, arranhando vários idiomas, acabou pescando, por uma conversa entre Abgar e a estrangeira, quem era ela. Intimamo-lo a calar-se, sob pena de o denunciarmos como “prestista”. Éramos amigos do governo, e este tomara posição contra o dr. Júlio Prestes, candidato à Presidência da República. Jorge encolheu-se, talvez por motivos que sempre desaconselham um encontro com a autoridade.

À véspera da partida, nossa amiga levou-nos a jantar no Grande Hotel e — lembro-me perfeitamente — fixou os olhos na mesa vizinha, onde uma família chegada da Bahia abrangia um garotinho de cerca de dois anos. Greta mirou a testa larga do guri, e disse pensativamente: “É poeta”. Tive a curiosidade de procurar no livro da gerência o nome da família: Amaral; e do neném: José Augusto. É hoje o poeta e crítico de cinema Van
Jafa, que, decerto, ignora esse vaticínio.

Saímos ao entardecer para uma volta no parque, e lá Greta Garbo, mãos nas mãos, pediu-nos que jamais lhe revelássemos a identidade. De resto, ela própria não sabia mais ao certo quem era: as personagens que interpretara se superpunham ao “eu” original. Uma confusão… “Gostaria de ficar entre vocês para sempre, tirando leite das vaquinhas num sítio em Cocais. That’s a dream.” Furtamos um papagaio do parque e o oferecemos à amiga; reencontro essa ave no texto de Paris Match, dizendo: “Hello, Greta” e imitando sua risada, entre gutural e
cristalina… Como a vida passa! Mas, agora, não posso calar.

Vida e obra de Drummond através de entrevistas


Programa produzido pela TV Cultura.

 

Você pode se interessar também pelos seguintes livros de Drummond:

“70 Historinhas”, de Carlos Drummond de Andrade

Caminhos de João Brandão”, de Carlos Drummond de Andrade

Sentimento do mundo“, de Carlos Drummond de Andrade

Os dias lindos“, de Carlos Drummond de Andrade

 

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